Os carros elétricos proliferam cada vez mais nas estradas. No entanto, a transição para este tipo de viaturas não é um caminho fácil. O Centro Europeu de Estudos Políticos (CEPS), com o apoio da Associação de Construtores Automóveis Europeus (ACEA), identificou os desafios.
Segundo o relatório, “a indústria automóvel europeia está numa conjetura crítica”, em que “a transição para veículos elétricos (EVs) é crucial para os objetivos climáticos da UE”.
De facto, como é sabido, a União Europeia quer atingir a neutralidade carbónica em breve, prevendo até o fim dos motores de combustão dos novos carros a partir de 2035.
Porém, segundo o CEPS, a transição para carros elétricos na Europa “requer uma transformação significativa” a vários níveis. Um contexto em que, defende, “a mudança nas estruturas de receitas e custos, assim como a competitividade da indústria automóvel da UE, irão determinar se as vendas de EV conseguem compensar o antecipado declínio das receitas dos motores de combustão interna”.
A análise focou-se sobretudo em automóveis de passageiros, carrinhas e ligeiros. O extenso documento, que o Auto ao Minuto consultou, aponta vários desafios para a transição para carros elétricos na Europa. Eis aqui alguns dos principais.
Custos e preços
Estima-se que em 2030 a diferença de preços entre motorizações convencionais e elétricas seja mais ténue do que atualmente. No entanto, realça que “os preços são moldados não só pelos custos de produção, como também por fatores como as margens do produtor, margens de lucro do concessionário e impostos”.
No entender do CEPS, “serão necessários preços médios dos veículos elétricos a bateria de aproximadamente 45.000 euros para manter as atuais estruturas de preço durante a transição”. Ao mesmo tempo que é um valor muito acima do que o consumidor médio está disposto a pagar (20.000 euros), o cenário não deverá mudar sem reduções dos custos. De modo a conseguir um ritmo maior de redução dos custos, é sugerida “uma combinação de medidas do lado da procura, como incentivos dedicados, e apoio no lado do fornecimento”.
Infraestrutura de carregamento
Tem-se vindo a assistir a uma expansão da infraestrutura de carregamento à medida que há mais veículos elétricos a circular. Mas estima o CEPS que serão necessários investimentos nesta área entre 98 e 172 milhões de euros até 2030 – em grande medida em infraestrutura privada.
Fala de desafios no que toca à regulação, destacando “a ausência de procedimentos e prazos padronizados, custos imprevisíveis e colaboração insuficiente entre autoridades públicas e Operadores do Sistema de Distribuição, a par de uma falta de planeamento integrado entre autoridades”.
Custos de carregamento
O CESP recorda, também, a questão dos custos totais que representa um veículo elétrico para além da aquisição – sendo que os automóveis a combustão costumam levar vantagem nos segmentos mais baratos e para condutores menos frequentes.
Segundo este relatório, os utilizadores de viaturas elétricas têm de lidar com preços variáveis conforme o sítio de carregamento. Há, também, a problemática da complexidade, em que os custos podem varias conforme o nível de potência e o tipo de ligação à rede.
Emprego
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Pode ler-se no relatório que “a transição para EV irá ter um impacto significativo no emprego e habilitações no setor automóvel”. Alerta-se para uma reestruturação que afeta “toda a cadeia de valor, causando perdas de emprego em algumas áreas e criação de emprego noutras, possivelmente além-fronteiras”.
Tem vindo a existir um investimento forte na transição por parte dos construtores e fornecedores, “levando a uma integração vertical mais forte nos fabricantes de veículos analisados (…), que pode ajudar a reduzir o impacto da transição no emprego”. Porém, há a ressalva de só as empresas mais apetrechadas financeiramente serem capazes de fazer estes investimentos.
Rede elétrica
A própria rede elétrica representa um desafio na transição para veículos elétricos, segundo o CEPS. Sublinha que “a implementação de infraestrutura de carregamento tem de ser complementada com melhorias às redes elétricas, que irão variar de região para região devido a diferenças na prontidão da rede, adoção de veículos elétricos e necessidade de carregamento residencial”.
Mercado
O próprio mercado tem desafios no contexto da transição para carros elétricos na Europa. Há dúvidas quanto ao ritmo e estabilidade da procura por veículos deste tipo, já que alguns indicadores sugerem que a evolução da mobilidade elétrica pode ser menos linear do que o esperado – mais concretamente, a quantidade de novos registos em 2024 aquém do esperado. Os fabricantes europeus têm, também, perdido espaço de mercado para novos atores e adversários internacionais.
Produção de baterias
Salienta o CEPS que é fulcral escalar o fabrico europeu de baterias, com necessidades de investimento de até 382 mil milhões de euros até 2030 para corresponder à procura futura projetada. As baterias representam ainda um custo considerável dos veículos elétricos e estima-se que os preços das baterias fabricadas na Europa sejam “cerca de 20 por cento mais elevados do que na China” – país de onde são originárias cerca de 70 por cento das células usadas na Europa.
Valor acrescentado para a UE
A transição para veículos elétricos pode representar uma quota de valor acrescentado mais baixa na produção de automóveis na UE, já que as cadeias de valor “ainda não estão totalmente desenvolvidas”. A estimativa aponta para um valor acrescentado europeu de 85 a 90 por cento do preço para os veículos de combustão, enquanto no caso dos elétricos fica nos 70 a 75 por cento. E, se a produção estiver a cargo de empresas estrangeiras, o valor acrescentado é ainda mais baixo (50 a 60 por cento).
Equilíbrio nos fluxos de receitas
Outro dos desafios apontados pelo CEPS prende-se com as mudanças de equilíbrio nos fluxos de receitas. Prevê a entidade que as receitas deverão ultrapassar as dos veículos de combustão por volta de 2030, o que irá exigir uma dependência crescente nas vendas de veículos elétricos e de outras fontes de receitas. Segundo o CEPS, em teoria há a possibilidade de obter receitas extra, com “modelos de negócio como serviços conectados ou aluguer de baterias e reutilização”.
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